Um terço do dos 2,2
milhões de implantes dentários feitos anualmente no país é produto de
pirataria. As peças piratas podem causar problemas que vão da queda do dente
artificial até graves infecções na boca.
A estimativa é da
Abimo (Associação da Indústria de Equipamentos Médicos e Odontológicos),
baseada na comparação entre o número de procedimentos e o de produtos vendidos
legalmente.
Muitas das vendas
ilegais são feitas por meio da internet. Há paginas no Facebook anunciando
peças (pinos) a partir de R$10 – no mercado legal, o preço varai entre R$300 e
R$500.
O assunto foi
debatido em congresso internacional de odontologia, no mês passado, e está
levando dentistas, empresários e a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância
Sanitária) a discutir uma revisão nas normas para que haja um rastreamento dos
implantes até o usuário final.
A implantodontia é
uma das áreas que mais crescem na odontologia. Em cinco anos, o número de
especialistas com registro no Crosp (Conselho Regional de Odontologia do Estado
de São Paulo) mais do que duplicou, passando de 968 para 2.423.
A especialidade
também liderou o número de denúncias contra dentistas em 2014 – com 32% das 270
recebidas -, a maioria pro problemas técnicos e serviços malfeitos.
“Tem gente
comprando um torno e fabricando implantes na garagem. E o que é mais preocupante:
tem dentista comprando”, diz o superintendente da Abimo, Paulo Henrique
Fraccaro.
Para ele, além de
desleal do ponto de vista mercadológico, a prática é criminosa. “Não sabemos se
as peças têm condições mínimas de qualidade. Podem causar danos físicos
(infecções) e financeiros (perda) ao paciente.”
O implante é
composto pelo pino de titânio inserido no osso da boca e um outro componente em
que a prótese será cimentada ou parafusada.
Os que têm registro
na Anvisa passam por uma série de testes, como o de resistência, de fadiga e de
esterilidade. Como é um material que fica dentro da estrutura óssea, ele é
desenvolvido para interagir com esse osso de forma a não apresentar rejeição.
Segundo a Abimo, as
peças mais pirateadas são os componentes que se fixam nos pinos. Normalmente,
eles são feitos com dimensões de encaixe mais folgadas, o que faz com que se
afrouxem. Nesse espaço, pode haver proliferação de bactérias.
“Isso leva a pessoa
a perder o implante, além de sofrer o risco de inflamações e infecções”,
explica Claudio Miyake, presidente do Crosp.
O grande atrativo
para os dentistas usarem implantes piratas é o preço. A peça completa chega a
custar 60% a menos do valor cobrado pelos fabricantes oficiais – R$700 a
R$3.500, dependendo do tipo (feito na hora ou após algum tempo da perda
dentária, da quantidade de dentes e da origem do material nacional ou
importado).
RASTREABILIDADE
Hoje as empresas
não têm obrigação legal de identificar suas peças para que possam ser
rastreadas diante de um eventual problema. Assim, segundo Miyake, fica difícil
comprovar que uma infecção, por exemplo, foi causada por um implante pirata.
Segundo ele, a
categoria espera a aprovação de um projeto de lei estadual que obrigará a venda
de produtos odontológicos com a devida identificação.
“O que a gente sabe
é que o insucesso de um implante tem relação direta com a qualidade do material”,
diz o cirurgião-dentista Reinaldo Papa, que já atendeu vários casos de vítimas
de implantes piratas ou de má qualidade.
A comerciante Maria
Elvira de Melo, 57, é uma delas. Há oito anos, ela perdeu nove implantes
dentários por má qualidade do material – o problema só foi descoberto após o
material ser retirado da boca.
“Uns oito meses
depois de fixados, eles começaram a ficar moles e caíram”, conta.
Na época, o
dentista se eximiu de qualquer responsabilidade. “Eu poderia ter processado,
mas não sou de briga. Preferi amargar o prejuízo, procurar um outro
profissional e refazer o trabalho.”
Segundo o cirurgião
dentista Rodolfo Candia Alba Junior, da Conexão Sistemas de Prótese, uma
estratégia das empresas para fazer frente aos concorrentes piratas tem sido dar
aos dentistas garantia vitalícia dos implantes, desde que os componentes
protéticos usados sejam produzidos por elas.
A Abimo também
discute a adoção de uma carteira de clientes, onde ficariam registradas
informações (como um código de barras) sobre os componentes do implante. “Seria
como uma carteira de vacinação, que ficaria em poder do paciente. É uma
garantia para ele de que o produto tem origem”, diz Fraccaro.